Nosso sócio, Cuca, escreveu sobre o recente episódio que envolveu Monark e o Flow Podcasts, e como o assunto tangencia o mercado da comunicação.
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No dia 7 de fevereiro, Kim Kataguiri e Tabata Amaral estiveram no Flow Podcast, e o que aconteceu todo mundo sabe. Monark, um dos âncoras, defendeu a liberdade de expressão total, mesmo para nazistas ou neonazistas. Para ele, deveria, inclusive, ser possível a existência legalizada de um partido com a bandeira da suástica. Mesmo sendo contra a ideologia, ele acha que todos devem ter voz.
A internet desde então só fala nisso. Flow, uma empresa com mais de 80 funcionários, perdeu patrocinadores e Monark foi demitido no dia seguinte, não só da apresentação do programa como do quadro societário da empresa. E não se trata de mimimi: a propagação de mensagens como a de Monark (e ele é reincidente) faz com que haja a naturalização da intolerância extremista sobre o que se é e não apenas sobre o que se pensa. Vide Karl Popper e o próprio Flow, do dia 8, que trouxe o historiador e cientista político André Lajst para tratar sobre o assunto.
Mas há alguns meses, o convidado era Rogério Skylab, compositor e músico performático. Um dos temas abordados pelo entrevistado foi, justamente, a responsabilidade que os apresentadores, Igor e Monark, deveriam ter. Com um verdadeiro canhão em mãos — estamos falando não só do maior canal de podcasts do Brasil, com dezenas de milhões de visualizações mensais, mas também do maior conglomerado de podcasts do país — a dupla de sócios-fundadores foi colocada na parede pelo também “filósofo”. Segundo o convidado, eles deveriam assumir a posição de jornalistas e ter noção do impacto massivo que suas palavras e de seus convidados têm em seus espectadores. A dupla rebateu dizendo que não eram jornalistas e que o espaço servia como uma mesa de boteco, onde sua responsabilidade era trazer pessoas dos mais variados espectros do pensamento humano. É curioso que o artista, que fazia em seus shows uma performance simulando esfaquear alguém da primeira fila da audiência, tenha dado uma aula de consciência profissional aos meninos. Mas não vamos discutir sobre arte.
Sistematicamente, a comunicação vem sendo deixada de lado pelo que batizei de “engenharia da comunicação”. Houve um movimento de superespecialização das prestadoras de serviço. Hoje temos oferta de empresas que fazem design, outras que fazem tráfego, outras que fazem inbound, outras de mídias sociais, outras só relacionamento, outras só de influencers, outras que desenvolvem sites… Mas não todo site, porque tem uma que faz o front-end, outra o back-end e uma terceira que só faz conteúdo; só que essa terceira não faz SEO, então, precisamos contratar uma quarta.
As agências se dividiram em off-line, on-line e os oportunistas não param de cunhar termos para vender cursos, livros e palestras, como o “all-line”. Nessa enxurrada de inseguranças, impermanências, ansiedades, vulnerabilidade, inconstâncias e incertezas contemporâneas quem é que cuida da comunicação de fato? Quem está olhando para a base de tudo, para essa necessidade inerente ao ser humano — e às marcas — que é se comunicar? Ou melhor: “… que é ‘se comunicar com propriedade, eficiência e responsabilidade’?” Quem é que zela para que toda essa tecnologia e dados façam sentido? Quem cuida da verdade, da alma e da reputação? Quem cuida do impacto que as mensagens podem ter?
As ferramentas estão aí e são excelentes, mas é preciso saber usá-las. Quando só um relatório de CPM é o que basta, eu pergunto: “Por quê?” e “Como?”
Os movimentos universais são cíclicos, mas a gente sempre esquece e entra de novo no turbilhão da novidade. É como a bolsa: vai e vem mas nos comportamos como uma manada.
Uma pena que Monark, que iniciou no Youtube fazendo gameplay e se posiciona como nerd, não tenha aprendido nada com a frase célebre de Homem-Aranha: “um grande poder exige grande responsabilidade”. Eu adoro esse formato novo de podcast que tem horas de duração, pois conseguimos entrar de fato na conversa e conhecer melhor as pessoas. Mas para ser comunicador, tem que ser por inteiro.
Daniel Cuca Moreira é sócio-fundador da Incomum